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Américas

Colômbia quer fim da guerra às drogas

"É hora de aceitar que a guerra contra as drogas foi um fracasso total", anunciou o presidente colombiano Gustavo Petro durante sua posse, no início deste mês

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O país é lar do notório narcotraficante Pablo Escobar, e a origem do lendário Ouro de Santa Marta –que já foi uma das variedades de maconha mais procuradas nos Estados Unidos– nomeado em homenagem à cordilheira Sierra Nevada de Santa Marta, na Colômbia.

Para muitos, a Colômbia é sinônimo de cartéis de drogas e narcotraficantes. É também um dos maiores produtores de narcóticos do mundo: no ano passado, o governo dos EUA estimou que o país produzia mais de 1 milhão de quilos de cocaína, a maior quantidade do mundo e mais do que as duas nações mais próximas, Peru e Bolívia, juntas. Assim, quando o novo presidente do país sul-americano disse que pretende regular o uso de substâncias ilícitas – ou pelo menos de algumas delas – o mundo parou para ouvir.

“É hora de aceitar que a guerra contra as drogas foi um fracasso total”, anunciou o presidente colombiano Gustavo Petro durante sua posse, no início deste mês, comentando sobre um projeto de lei que seu governo apresentou recentemente ao Congresso para legalizar a maconha recreativa.

A lei da Colômbia já permite a produção de cannabis para fins medicinais, principalmente para ser exportada para mercados estrangeiros como os Estados Unidos e o Canadá, mas os defensores da nova legislação acreditam que a legalização da cannabis recreativa pode afastar milhares de agricultores do tráfico de drogas e aproximá-los do comércio legal.

Até hoje, o Estado colombiano enfrenta desafios no controle de seu território provocados por uma série de criminosos, de ex-guerrilheiros de esquerda e paramilitares a narcotraficantes e sindicatos do crime organizado. O narcotráfico é uma poderosa fonte de receita para esses bandidos e, nos últimos 50 anos, as autoridades públicas pressionaram por uma agenda proibicionista, condenando o comércio e o consumo de drogas para atingir os bolsos dos criminosos. Mas o fluxo de drogas ilícitas nunca cessou.

“Nunca alcançaremos a paz na Colômbia enquanto não regulamentarmos o narcotráfico”, comentou o senador Gustavo Bolivar, um dos signatários do novo projeto de lei e aliado próximo do novo presidente.

“Nem mesmo os Estados Unidos, com toda a sua força e dinheiro, conseguiram vencer a guerra contra as drogas. Neste momento, a Colômbia produz mais drogas do que quando Pablo Escobar estava vivo, existem mais consumidores e mais produtores. O tráfico de drogas está crescendo, apesar do dinheiro que investimos para combatê-lo e das milhares de mortes que sofremos”, afirmou Bolivar, que recentemente viajou para o estado do Colorado, nos EUA, para ver em primeira mão os benefícios econômicos da legalização da maconha.

Em entrevista, Bolívar disse à CNN que era hipocrisia dos Estados Unidos legalizar a maconha em casa e apoiar guerras às drogas no exterior, como na Colômbia, para onde Washington envia milhões de dólares todos os anos para armar e treinar forças colombianas em sua luta contra os cartéis.

Um relatório histórico da Comissão da Verdade, um painel interdisciplinar encarregado de investigar mais de 50 anos de conflito civil na Colômbia, descobriu que o narcotráfico ajudou a prolongar o conflito, apesar de quase US$ 8 bilhões (cerca de R$ 42 bilhões) em ajuda militar dos EUA à Colômbia. Pelo menos 260 mil colombianos, a grande maioria civis, foram mortos pela violência.

Uma nova geração de líderes colombianos

A campanha para legalizar a maconha na Colômbia une senadores de esquerda, como Bolivar, a organizações da sociedade civil e ricos investidores estrangeiros, e recebeu um impulso nos últimos 12 meses de mudança política do país, com Petro ascendendo à presidência e partidos progressistas agora representando a maioria no congresso colombiano.

“Imaginávamos a legalização do uso recreativo para adultos em dois, três ou quatro anos. Mas agora esperamos que isso aconteça ainda neste ano”, disse Luis Merchan, um empresário colombiano que é CEO da Flora Growth, uma empresa sediada em Toronto, no Canadá, que está investindo em maconha colombiana, da cannabis medicinal ao cânhamo têxtil.

Os ativistas que batalharam por essa mudança por anos concordam.

“Achamos que chegou a hora”, afirmou Luis Felipe Ruiz, investigador da ONG colombiana Dejusticia, que apoia a descriminalização das drogas e documenta a guerra contra as drogas há anos. O narcotráfico é a principal causa de detenção na Colômbia e, de acordo com o Ministério da Justiça colombiano, 13% dos presos do país estão cumprindo uma sentença relacionada ao comércio de drogas. Ruiz argumenta que um dos benefícios da legalização da maconha também seria a diminuição da população carcerária no país.

“Uma grande parte do mundo político está pronta para ter um debate sobre a legalização da maconha e, francamente, tirar o estigma da cannabis já é uma grande vitória para nós”, afirmou Ruiz à CNN.

Aqueles que se opõem à legalização vêm da direita conservadora e acreditam que a mudança apenas tornaria o abuso de drogas mais fácil. O ex-presidente Álvaro Uribe, mentor político do antecessor de Petro, Ivan Duque, e principal expoente do conservadorismo no país, tuitou em 2020 que “a maconha recreativa leva a outras drogas, altera os neurônios, o consumidor chega a estados de alienação, perde o controle sobre suas decisões, que é a perda de sua liberdade”, comemorando quando um projeto anterior de legalização da maconha havia sido bloqueado no Congresso.

Agricultura ilegal

Historicamente, a maconha na Colômbia é cultivada por pequenos agricultores que não podem pagar as licenças farmacêuticas necessárias para produzir cannabis medicinal, então acabam vendendo sua produção para cartéis de drogas.

O projeto de lei apresentado ao Congresso poderia permitir que esses pequenos produtores, a maioria baseada em regiões rurais cronicamente subdesenvolvidas da Colômbia, finalmente entrassem no mercado legal.

A COCCAM, uma confederação de produtores de coca, maconha e papoula que trabalha como grupo de lobby para agricultores ilícitos, estima que até 3.000 famílias dependam da maconha ilegal como principal fonte de renda, principalmente no estado de Cauca, no sudoeste do país. Na maioria dos casos, esses produtores vivem em áreas rurais isoladas que estão a horas de distância da estrada pavimentada mais próxima.

Em comparação com produtos agrícolas legais, como frutas e vegetais, a maconha e as folhas de coca não estragam em poucos dias e são vendidas a um preço mais alto por quilo. Elas também têm a vantagem de crescer durante todo o ano, enquanto a maioria das plantas possuem safras de apenas alguns meses por ano.

Devido ao papel histórico da Colômbia, legalizar o uso recreativo seria uma imensa mudança cultural –e talvez um motivo de orgulho, comentou Marchan.

“Não seria só um motivo de orgulho, mas para alguém como eu, pelo que antes era malvisto: estou no negócio há décadas, e quando alguém descobre que sou da Colômbia, sempre tem aquele ‘ahh’, aquele olhar estranho”, acrescentou.

Cocaína legal?

Bolivar, o senador, acredita que o sistema regulatório colombiano acabará seguindo o mesmo caminho, legalizando não apenas a maconha, mas até a cocaína –a fonte de renda mais lucrativa para os cartéis.

A definição de números em um mercado ilícito nunca é uma ciência exata, mas um estudo de 2016 do governo colombiano estimou que o narcotráfico –o fluxo de drogas ilegais, principalmente cocaína, que é produzido na Colômbia e vendido em mercados internacionais da Europa, América do Norte e Ásia– valia até 3,8% do PIB colombiano, ou US$ 7,5 milhões na época.

Em comparação, o consumo de drogas ilícitas –que se destina a ser consumido ilegalmente na Colômbia e onde a maconha desempenha um papel maior– valia 0,75% do PIB colombiano, ou US$ 2,18 milhões.

“A maconha é peixe pequeno no tráfico de drogas. O dinheiro que os cartéis ganham, e a maior parte do problema, vem da cocaína. E as pessoas na Colômbia e no México continuarão a morrer enquanto olharmos para o problema com hipocrisia”, disse Bolivar à CNN.

Ele prevê uma rede de dispensários regulamentados pelo Estado (onde a cocaína poderia ser vendida sob prescrição médica) e acordos regionais em outros países produtores de drogas. Os três maiores produtores de cocaína do mundo –Bolívia, Colômbia e Peru– são atualmente governados por líderes de esquerda ideologicamente alinhados. A Bolívia tem um próspero mercado legal de subprodutos de coca, principalmente folhas secas que são mastigadas pela população indígena e, já em 2012, os governos da Bolívia e da Colômbia pressionaram por uma revisão regional das políticas sobre drogas em reuniões multilaterais.

“Poderíamos, por exemplo, fazer um pequeno tratado em nossos países para modificar a Convenção Única sobre Entorpecentes de 1961 e estabelecer a primeira bandeira de legalização no mundo, e outros países poderiam nos seguir”, sugeriu o senador.

Mas antes que tratados internacionais sejam reescritos, a Colômbia ainda pode enfrentar uma batalha legal pela frente. No estado em que se encontra, a Constituição colombiana proíbe explicitamente o uso de narcóticos sem receita médica. Portanto, mesmo que o Congresso tenha aprovado uma lei que legalize a maconha recreativa, ela pode ser considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal.

Um recurso para eliminar esse artigo já foi apresentado por outro legislador, o deputado Juan Carlos Losada.

“É uma batalha de duas frentes. Nosso projeto de lei de legalização no Congresso, e o recurso de Losada à corte constitucional. O que vier primeiro, terá nosso apoio, porque este país precisa de paz”, concluiu Bolivar.

Por CNN

Cassio Felipe

Professor, Escritor e Jornalista Especialista em Relações Internacionais e Diplomacia

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