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Artigos

Uma consciência profunda não permite grandes alegrias

A parte I da resenha do livro Nos Cumes do Desespero, do filósofo romeno, Emil Cioran, mostra que uma mente profunda e incessante pode nos transformar em atordoados seres humanos sem senso de pertencimento ao mundo em que vivemos, sem grandes alegrias, mas com profundas tristezas

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Certamente, o livro mais atordoante que eu li em minha vida levou-me à uma mais profunda reflexão sobre a existência humana. Ao lê-lo, tive a impressão de que o autor está conversando comigo ou, mais que isso, confessando a angústia e depreciação em relação a si mesmo, em primeiro lugar e, depois, aos semelhantes. Alguns trechos são muito tocantes, iniciando pelo prefácio, onde ele registra, em primeira pessoa do singular, que escreveu o livro em 1933, aos 22 anos de idade, na cidade de Sibiu, na Transilvânia, escondido de seus pais, dizendo-lhes que estava escrevendo uma tese, e confessando que menosprezava quem não se comunicasse filosoficamente. Mais que tudo isso, aponta que escrever o livro foi uma espécie de liberação, de explosão salutar. 

Logo no começo, Cioran expressa o desejo de mudar-se a algum lugar distante deste mundo, onde abdicaria da necessidade de ter amigos e aspirações, esperanças e sonhos lamentando a fraqueza de querermos viver e morrer em sociedade, preferindo viver só e abandonado, sem afetação e mentiras e argumentando que a verdadeira morte é o momento em que nos separamos da vida, do amor, do sorriso dos amigos e mesmo da morte. De forma desconcertante, ele se questiona o que podem esperar deste mundo aqueles que sentem além da normalidade, da vida, da solidão, do desespero e da morte. Isso mostra o quanto profundo e inacessível era o seu pensamento e a terrível consciência que possuía da miserabilidade humana.

Emil explica que poder sofrer sozinho é uma grande vantagem, pois se todo sofrimento pudesse ser transformado em um semblante, seria muito difícil trocar palavras com as pessoas sem esconder os verdadeiros sentimentos alegando que a vida seria impossível diante dessa condição e que ninguém ousaria se olhar no espelho, pois veria feridas sempre abertas e lágrimas incontíveis. Segundo ele, a verdadeira solidão nos isola completamente entre o céu e a terra, revelando, neste espaço, todo o drama da finitude.

Quando o leitor acredita que sua escrita chegou aos mais profundos recantos da alma do autor, Cioran consegue cavar mais fundo, explicando que o fato de que o mundo tenha permitido a existência de um ser humano como ele mostra que as manchas sobre o sol da vida são tão vastas que elas acabariam por esconder a luz sentindo a estranha sensação de que a sua idade, considerava-se um especialista do problema da morte confessando que amaria perder a consciência de si mesmo e deste mundo afirmando que uma lágrima tem sempre fontes mais profundas que um sorriso.

Emil trata a morte como uma questão onipresente e inerente à vida humana argumentando que a vida é uma agonia prolongada e demoníaca, pois dá à luz a formas que ela mesmo destrói afirmando que tudo se reduz ao medo do fim. Segundo ele, viver só significa nada mais esperar e nada mais pedir da vida, pois a morte é a única surpresa da solidão e que os grandes solitários nunca se retiraram para se preparar para a vida, mas, ao contrário, para esperar o seu desfecho. 

Ao longo do livro, Emil deixa claro que tem um sentimento implícito da sua nulidade e insignificância questionando-se sobre a razão de estar vivo e o fato de não parar de viver confessando que nunca chorou, pois suas lágrimas se transformaram em pensamentos tão amargos quanto às próprias lágrimas argumentando que nem a resolução para todos os seus problemas o tornaria menos inquieto, uma vez que sua inquietude brota da própria estrutura da existência, não sendo os problemas que o torturam, mas as chamas e convulsões  interiores. 

Semelhantemente à frase que afirma que a ignorância é uma benção, Emil constata que somente são felizes aqueles que não pensam, ou seja, aqueles que pensam somente o necessário para viver. Assim, ter uma consciência sempre alerta, redefinir sem parar as suas relações com o mundo, viver numa tensão perpetua do conhecimento, leva-nos a estar perdidos para a vida. Tal inquietação já levantada por muitos filósofos sugere que uma grande e profunda consciência sobre a condição humana, causa uma tristeza da mesma intensidade. “Afinal, quanto maior o saber, maior o sofrimento; e quanto maior o entendimento maior o desgosto.” – Eclesiastes 1:18.

Para a solidão, assunto recorrente do seu livro, Cioran afirma que existem dois tipos dela: a individual e a cósmica. Para ele, a primeira é a condição de virmos ao mundo e sermos abandonados à própria sorte, sendo destruídos pelas próprias deficiências e exaltações. A segunda, é como se o mundo tivesse perdido totalmente o brilho evocando a monotonia essencial de um cemitério. Sobre elas, ele se recusa a responder quais pessoas são as mais infelizes, pois acredita que estar só já é o bastante e que não se atreveria a definir uma hierarquia da solidão. Ao mesmo tempo, afirma que não precisa de nenhum apoio, encorajamento ou compaixão, pois, por mais caído que seja, sente-se poderoso, duro e feroz. 

Mais profundamente do que tudo o que ele tenha escrito até a metade do seu livro é o momento em que ele se julga deter o monopólio da solidão afirmando que tem a ideia de ter concentrado em si todo o sofrimento deste mundo e de ter o seu gozo exclusivo. Contudo, declara que nenhum suicídio provem unicamente de uma reflexão sobre a inutilidade do mundo ou sobre o vazio da vida, mas que, aqueles que se suicidam, já haviam esgotado a menor parcela de vida e de alegria e suprimido toda a tentação. Para ele, os homens nunca se suicidam por situações exteriores, mas sim, por um desequilíbrio interno passando por tanto tormento e suplicio, estando colapsado violentamente que a vida nada mais é que um turbilhão trágico.  

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Cassio Felipe

Professor, Escritor e Jornalista Especialista em Relações Internacionais e Diplomacia

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