Terms & Conditions

We have Recently updated our Terms and Conditions. Please read and accept the terms and conditions in order to access the site

Current Version: 1

Privacy Policy

We have Recently updated our Privacy Policy. Please read and accept the Privacy Policy in order to access the site

Current Version: 1

Artigos

As solidões que habitam em mim

"Só são profundos os sentimentos que se escondem." - Emil Cioran

0:00

Experimento uma estranha sensação ao pensar que sou, à minha idade, um especialista do problema da solidão, parafraseando Emil Cioran, filósofo romeno. Solidão essa que me consome de forma severa, fazendo-me perder a crença de que qualquer ser humano possa me preencher, incluindo a mim mesmo. Vivo demasiadamente profundo em um universo escuro onde a minha insignificância me provê a companhia dos meus demônios interiores, os únicos que ainda não me abandonaram.

Atrevo-me a professar que até eu mesmo já o fiz. Contudo, eles continuam impávidos povoando o vazio da minha alma, ocupando-a com sua matéria obscena que se liquefaz assumindo uma forma que me impossibilita encontrar alguma explicação. O fato de que o mundo tenha permitido a existência de um humano tal como eu mostra que as manchas sobre o sol da vida são tão vastas que elas acabarão por esconder a luz.

Todavia, se de alguém eu necessitar, não buscarei a ninguém que eu não possa ver quando me olhar no espelho, pois viver só significa nada mais pedir, nada mais esperar da vida. A morte é a única surpresa da solidão. Os grandes solitários nunca se retiraram para se preparar para a vida, mas, ao contrário, para esperar, resignados, seu desfecho. Afinal de contas, para mim, a forma material da solidão é aquela que vejo ao me olhar o espelho. É assim que ela se me apresenta. Devo amá-la, porque ela é eu, eu sou ela; juntos nós somos.

No meu âmago, ainda sei que, por mais que eu já tenha me abandonado, como evidenciado, até este momento, a única pessoa com que sinto que posso contar é comigo mesmo. Meus demônios não o sabem, mas apesar de serem meus amigos, nem sempre são os meus melhores conselheiros, visto que estão ocupados demais preenchendo o meu vazio existencial. Eu tenho o sentimento implícito da minha nulidade e da minha insignificância.

Degusto um misto de sensações. Por vezes, tudo me parece claro como um lindo dia de céu azul cantado por pássaros em um jardim repleto de flores coloridas exalando deliciosos aromas. Noutras, deparo-me com um deserto de dimensões continentais em que rara vida brota sob as pedras duras e os cactos espinhosos que insistem em subsistir sob um sol escaldante e a secura da terra coberta por areia. Nem mesmo a resolução de todos os problemas me tornaria menos inquieto, uma vez que minha inquietude brota da própria estrutura da existência. Não são os problemas, então, mas as convulsões e as chamas interiores que me torturam.

A esta altura, impressiono-me com a persistência da minha existência. Não sei se me sinto só no mundo ou se sinto toda a solidão do mundo dentro de mim. Do mesmo modo, ainda não vejo com clareza se o mundo me abandonou ou se eu mesmo o fiz. A mais suprema solidão que me habita, tão mais poderosa se faz nos momentos em que estou acordado comigo mesmo. Manter-me ocupado com o meu trabalho me faz sentir-me pleno, mas o vazio me atinge implacavelmente quando pretendo poupar-me da escravidão a que me submeto por minha própria culpa. Seria audacioso demais dizer que detenho o monopólio da solidão?

Eu não me desafiaria a explicar o que sinto, pois não existem palavras capazes de me significar. Só sei que a solidão me acompanha desde os primórdios da minha existência. Com ela, aprendi a lidar e, dela e com ela, aprendi a me preencher. Provavelmente, eu nunca consiga explicar os meus pensamentos, pois sabê-lo, de alguma forma, cansar-me-ia, pois sinto que estou sempre em busca de mim mesmo, mas que talvez eu nunca me encontre, eu nunca me explique, eu nunca me entenda, eu nunca me preencha, eu nunca saiba quem realmente sou. Talvez, tudo o que eu tenha escrito até agora seja para justificar a falta de coragem de descobrir o que realmente sou.

* Citações de Emil Cioran, filósofo romeno

Cassio Felipe

Professor, Escritor e Jornalista Especialista em Relações Internacionais e Diplomacia

Artigos relacionados

Verifique também
Fechar
Botão Voltar ao topo